segunda-feira, 5 de agosto de 2024

Pijama e pesadelo

 Hoje o meu maior medo tornou-se realidade. Cheguei a casa sem ti. Não estavas em casa. Ia fazer o jantar, trazia as compras, mas tu não estás em casa. Entrei na garagem de lágrimas nos olhos preparava-me para subir  para uma casa vazia sem estares ao meu lado. Sem sentir os teus passos, sem sentir o teu cheiro ou ouvir a tua voz. Chegava a casa. Não estás comigo e não vais estar. Daqui a pouco vou-me deitar e não vais estar cá. Não vou sentir os teus braços e o teu calor. Se tivesse acontecido o pior seriam assim os meus serões, seria assim a minha vida. Cheia de vazios, de ausências. A rua avó está calada como sempre, o teu pai dorme no sofá. Eu estou só com as minhas palavras. Com as minhas lágrimas e suspiros. Não posso confessar o quanto me dói este momento e para onde voam os meus medos. Não devo proferir em voz alta como poderia ser real este pesadelo que hoje apenas vislumbro. Fez-me voltar no tempo. Para uma altura em que a realidade de hoje poderia ser outra. Que podia ser o dia de hoje todos os dias, sempre. Um metaverso qualquer. Conhecemos muitos pais que vivem sempre este pesadelo. Que voltam todos os dias para uma casa vazia. Sem cheiros, sem brinquedos, sem risos e sem calor. Que afortunada sou! Que afortunada por o dia de hoje ser só um dia e não um presente. Que bom que estás a uma mensagem de distância. Que amanhã já dormirás nos meus braços. Que cresces e que vives experiências. Que sonhas e realizas. Eu vivo hoje com este peso, mas eu não importo. 

 Sei que não passa de um pesadelo que não é real. Sei que estás bem e feliz. Sinto no meu coração que estás bem. Estamos ligadas para sempre, sabes? Forever and forever. 

Foste à tua primeira festa de pijama em casa da tua grande amiga L. Estavam os pais, a irmã A, o irmão D. As Marias, a P. O resto das crianças são amigas da A ou da família e não conhecemos tão bem. Estavas muito ansiosa, ao almoço queixas-te-te com dor-de-cabeça e tudo! Querias muito um dormiloco. Achavas que era o mais fixe da dormida fora, mas desta vez não alinhámos. Era caro. Não fazia sentido fazer uma compra para uma vez. Também te temos de ensinar coisas de economia e gastos supérfluos. Faz parte… já tens 9 anos. É importante começar a perceber a diferença entre “querer” e “precisar”. Não gostas que te digam não, mas já vais compreendendo… estás a tornar-te em alguém muito especial. Vais ter uma inteligência emocional grande, tenho a certeza. Estás a ler o 8.º livro da Maria Lua “A Festa de Pijama”  é esta coincidência deixa-te maravilhada e entusiasmada. Tens estado muito contente com a perspectiva deste “sleep over”. Espero que te estejas a divertir e que não fiques desiludida com a noite nem ninguém. Nenhuma mãe ou pai quer ver a sua cria desiludida, claro!

Sinto-me com assim. Cheia de medos e de fantasmas, mas há no ar uma esperança. Posso não dormir porque me fazes falta. Posso não dormir à espera de me ligares para me dizeres que precisas de mim. Posso não dormir para não sonhar, para não ter pesadelos. Posso não dormir mas não faz mal. O que importa és tu. 

Acabas de me enviar uma foto. Estás deitada. Só se vê um olhinho. Ainda estás muito acordada. Amo-te muito. Mas vou ser corajosa. Tu podes ser tão corajosa quanto tu quiseres!


Mesmo com medo e um nó na garganta eu amo-te muito. E amar também é deixar ir. E eu deixei. Mesmo a doer muito. Amo-te muito minha Pimentinha forever and forever infinitos! 

sexta-feira, 8 de setembro de 2023

Antes de ontem dormiste sozinha. Sem mim e sem o papá. Apenas tu. Noutro quarto. Longe bem longe de casa, noutra casa. Ficaste toda a noite e não ouve lágrimas minhas nem desconfortos. Estou a fazer as pazes com a ideia de que estás a crescer. 

Ontem quiseste voltar para a nossa cama e vieste. Disseste que não dormiste bem. Vieste. Sem dramas nem lições de moral. Vamo-nos habituando aos pouquinhos. Um dia. Por ora continua a amar ter-te nos meus braços. Sempre é enquanto os quiseres. 

Amo-te muito minha Pimentinha. Muito mesmo. 



segunda-feira, 3 de setembro de 2018

1º Dia

Hoje foi o teu primeiro dia de escola!
Há tanto tempo que não escrevo! Tchi! Já se passou tanta coisa desde a última vez que escrevi por aqui! Mas não te preocupes, não aconteceu nada de mal contigo, muito pelo contrário. temos andado demasiado ocupadas a viver!
Hoje foi um dia mesmo muito especial. Um dia que não pensei fosse acontecer tão cedo. Desde o início do ano, logo que terminaste as 15 tomas de asparginase a Dra. S., andava a falar connosco para que fosses para o infantário o mais rápido possível. Por ela, já estarias na escola desde Março ou Abril... Ontem à noite não querias ir dormir. Sentias a nossa ansiedade, ou simplesmente não tinhas sono? Não sei. Apesar dos nossos esforços para que acalmasses e fosses para o "ó-ó bem" (a tua brincadeira preferida nos últimos tempos), não conseguias adormecer. Na verdade, na "semana de pausa" tens menos necessidade de dormir. Acho que se não fosse a doença/tratamentos já não dormias a sesta!
Andavas entusiasmada com a ida para a escola. Querias muito ir brincar na casinha e na cozinha e com as bolas... Sabias que a mamã e o papá não iam estar contigo (acho que ficaste um pouquinho nervosa com essa ideia, mas mostraste muita coragem), sabias que ias comer com os meninos e fazer chichi nas sanitas pequeninas. Não quiseste, recusaste as bolachas e a fruta que te deram e "xixi yellow não". Não faz mal. Um dia hás-de querer, quando te sentires preparada!
A professora disse-me que eras "de gancho"! Tens o teu feitio, lá isso é verdade! Cismaste que havias de trazer um brinquedo grande para o recreio. a professora E. não deixou. ainda assim, arrastaste-o quase até à porta.. Ela travou-te e tu de chateada atiraste a cadeira ao chão. Pediu que a levantasses. Tu não quiseste. Cruzaste os braços e fizeste beicinho. A professora fez-te sentar na cadeira e pedir desculpa. Demoraste algum tempo, mas lá pediste desculpa (e que fofos são os teus "ecupa"). Também tiveste saudade da mamã e do papá e choraste um pouquinho (disseste-me "uã tanto!). Sabes uma coisa, também tive muitas saudades tuas! e o papá também me contou que ficou com o coração apertadinho. Ao longo da semana disse-me que já não esperava voltar a sentir aquela ansiedade do primeiro dia de aulas e "a nossa menina vai para a escola!"😢 E vou-te dizer um segredo: Eu também! tentei não pensar muito nisso porque sabia que ias ficar bem e contente, mas não dormi bem toda a semana, tive insónias...
a professora aconselhou a irmos buscar os meninos antes de almoço e assim foi. Fui buscar-te. estavas com os outros meninos e a professora a marcarem as presenças e a falarem do tempo. Estavas a mostrar que sabias que o tempo estava de nuvens (na verdade, morrinhava), a professora mostrava os desenhos relativos ao tempo e tu levantaste-te e foste pegar na nuvem (sempre interventiva!). Quando a professora E. chamou a atenção de que estávamos lá (a avó T. estava comigo) vieste a correr muito muito ter comigo ( e que direitinho correste! - ainda não te tinha visto correr tão bem!)
Fique emocionada, vieram-me as lágrimas aos olhos. e tu também ficaste comovida. foi a primeira vez que te vi assim. tinhas um brilho  nos olhos mas aguentaste-te à bronca e não choraste. ficaste muito feliz de me ver e quiseste-me mostrar tudo com que estiveste a brincar ( a casinha, a cozinha, o supermercado, quiseste limpar as janelas, as mesas e as cadeiras com detergentes e um pano). demorámos meia-hora para vir embora (como sempre)!

Amo-te muito. Amamos-te muito minha Pimentinha! Estás a crescer e a ficar mais forte e saudável e amamos-te muito!

domingo, 4 de fevereiro de 2018

Mais Uma Voltinha

Mais a voltinha, mais uma viagem
Ainda não estamos em casa há dias semanas depois de mais uma estada no Hospital e estamos com medo de para lá voltar! 
Começaste com febre terça-feira dia 16 de Janeiro e a ordem foi dirigirmos-nos a Coimbra no dia seguinte. Fizemos as rotineiras análises e a ordem foi ficar, porque os neutrofilos eram muito pouquinhos. Aí uns 30 se não estou em erro. Isso e a constiação...
Lá esperámos, esperámos e voltámos ao quarto 3... Foram uns dias estranhos.Ora  estranhávamos o quarto (já estávamos habituados aos outros) ora doía ainda mais olhar para aquelas paredes e as letras sobre ela. Para aquela televisão. Ter a noção perfeita do sítio onde devia estar o "Bobby" para não levar uma cacetada da porta (o quarto é um pouco estreito). Olhar para o cadeirão amarelo e sentir-me a rolar pelo quarto empurrada pela Lilly que vinha limpar o chão. Foram uns dias difíceis. Estiveste muito tempo com febre rabugenta e sonolenta. Ficávas sem febre por leríodos muito curtos - 3 ou 4 horas.. Quase não comias. Pouco chocolate. Pouquíssimo iogurte. 
E agora ainda mal recuerámod o fôlego, estás a fazer febre outra vez. E mesmo a tempo do meu aniversário...
Minha Pimentinha, amo-te muito é estou preocupada! 

segunda-feira, 8 de janeiro de 2018

Menino Jesus

O Menino Jesus fez 2017 anos há pouco, que é o mesmo que dizer que ainda há pouco foi Natal. Este ano foi diferente. Ficámos por casa. Não fomos à quinta nem a casa da acó T. Ficámos aqui e eu gostei. Éramos só nós e correu tudo bem. Ainda comeste ovo cozido e tudo! Desta vez não te calhou no sapatinho nenhum carrinho super caro, mas debaixo da ãrvore não faltaram embrulhos. Eram carimbos, ovos de chocolate e tintas para pintar com as mãos. Eram lasticinas e cortadores em forma de gatinho ou patinho ou casinha  (entre outras), era uma tábua e ferro de passar e uma molinha de médico e uma fraldário com banheira e cadeirinha para os bebés. Era um carrinho de supermercado, um frigorífico cor-de-rosa e roupa. Era uma Minnie com roupinhas e um Mickey fofinho. E depois ainda vieram legos e mais um bebé com uma malinha, e outros jogos e um fogão. Vieram os bivós mais o avô e depois outra vez o avò mais a avó. Vieram os primos da Figueira mais a tia L. E depois outra vez a avó mais os tios e os primos. Uns de cada vez que não queremos muitas confusões, nemuita gente a respirar o mesmo ar. À prima demos  conjunto de magia e ao primo uma bateria. Sentou-se o primo e bateu (como ele disse). Sentou-se a prima e bateu, sentaste-te tu é tocaste! Tens jeito miúda! Tocas coordenada e com ritmo! Se quiseres vais lá!

A árvore continua montada, onpresépio também! Continua e há-de continuar. É uma alegria de manhã ouvir-te a pedir: tá-tá tá-tá! E a exclamares uau! Mal se acendem com um kêka pelo meio. Natal é enquanto nós quisermos. Natal é sempre que tu ou nós precisarmos. Natal é sempre q celebramos a vida e te vemos feliz.

Feliz Natal, Amo-te tanto, minha Pimentinha!  Muas  






Ano Novo.

É. Ano Novo. Para mim, para nós começa hoje. E vão 15 badaladas. E vão 15 passas. E vão mais de 30 semanas. E vão 15 pegasparginases. Acabou esta fase, começa outra. Temos ordem de ir a Coimbra só uma vez em cada três semanas. A cada início de ciclo. Temos ordem de vir ao hospital daqui 2 vezes em cada ciclo (os ciclos de três semanas mantèm-se - Mercatopurina, dexametasona, Ondanestrom, omeprazol, vincristina e metrotexato tambêm se mantêm). Temos ordem de procurar jardim de infância para ti e de viver uma vida mais normal. Temos ordem de os poucos sair um pouco deste caos de malas à porta. Não de às desfazer. Por ora mantêm-se feitas porque todos os medicamentos q baixam as defesas se mantêm. Mas vamos pó-las fora do caminho. Vamos cruzar os dedos e confiar em Deus e na sorte que não hão-de ser precisas. E vão 15. Estou feliz mas ansiosa. O que vem a seguir? É mais do mesmo? É um mundo novo? É mais liberdade? É. Tudo. Mais do mesmo mas tudo novo. Estamos sem rede. Não há análises para confirmar se está tudo bem semanalmente ou quase. Agora mal chegam a ser 2 vezes por mês. Vai começar a crescer-te o cabelo? Vais ganhar apetite e apetites? Vais começar a comer sopa e arroz e massa e batatas e feijão e ervilhas? Vais continuar a comer iogurtes enquanto a sopa blhac (que tu não sabes ainda bem o que é - por enquanto significa apenas "não quero!"). Tu gostavas de tantos alimentos que agora não comes. A imaginação jáe falta quando chega a altura de te oferecer alimentação. 
Eu não acredito em resoluções de Ano Novo. Não acredito em decisões vãs, feitas só porque sim em fim de festa porque vem aí o novo ano. Mas acredito em forças cósmicas. E parece-me sempre que com o advento do Novo Ano  também chegam novos ares. E recomeça a vida. O Inverno que prepara a terra para ser semeada. Que lhe dá descanso e que mata as pragas. Os desejos de Ano Novo que dá uma novo sorriso na cara de uns e outros. A Esperança de um dia maior e melhor. Os gatos que saem a rua de noite e o luar que é o mais belo do ano (dizem). A Natureza sabe que aí vem um Novo Cicl. E nisso acredito e é isso que sinto. Aí bem um Novo Ano. Que seja bem melhor que o anterior. Para mim, para ti, para nós!

Bom Ano. Amo-te muito, minha Pimentinha. 














segunda-feira, 11 de dezembro de 2017

As Crianças Também se Fartam de Sofrer

Hoje soubemos que um menino que costumávamos encontrar no hospital morreu. Não vamos encontrar mais o J. nem a mãe B. Dói-me tanto o coração e dói-me a mente. Cansada, não consigo desligar e dormir. O J  já estava internado da última vez que lá estivémos. Jantei uma vez com a mãe dele. Parecia-me triste e mais perturbada que o habitual. Só me apetecia dar-lhe um abraço, mas também senti que ela precisava de espaço e tempo para ela. As mães sofrem demais a ver-vos sofrer demais. O J saira de uma enfermaria que partilhava com o Pedro de Angola porque tinha muitas dores (disse-me a mãe) e não conseguia descansar com as sonoridades rítmicas do vizinho. Estranhei, mas não refutei nem questionei ninguém. Respeitei e calei, mas uma bola já me estreitava a garganta. Ouvi as palavras dor e morfina e estremeci. As crianças também se cansam de sofrer. O J frágil e neutropénico apanhou três bactérias das mais agressivas no pulmão e passou estás duas semanas nos cuidados intensivos. Chamarão o pessoal para se despedir dele. De Sexta-feira para Sábado deixou de sofrer. Soube hoje.

O J foi diagnosticado com 2 anos tal como tu e tinha a mesma doença que tu, mas correu mal desde o início disse-me logo a mãe quando a conheci, ainda com força, coragem e fé. Apanhou bactérias e infecções de catéter vários. Teve de usar saco para as necessidades e já andava nisto há pelo menos 4 anos (se bem que me parece que ele já tinha feito os 7 anos, por isso faz as contas).

Quando o comecei a ver no hospital de dia o João trazia a pele pálida e uma expressão de gente crescida de quem já passou por muito mas trazia um brilho no olhar e um sorriso no rosto. Falava com gosto da escola e de aprender, sendo q a única escola que alguma vez conhecera era a do hospital. Nos últimos meses já não era assim. De pagines nos ouvidos, mal levantava o rosto do tablet, pouco falava e só com a mãe. Já não o vi mais a comer fruta mas batatas fritas (da embalagem redonda). O J parecia cansado e triste.

Não te canses, por favor, meu amor. Luta com força e resiliência. Que o teu fardo não seja tão pesado que não o possas carregar. Eu vou cá estar enquanto precisares de mim para te ajudar conforme eu puder e e souber e tu me deixares. Eu amo-te muito, minha Pimentinha. Tanto, mas tanto! Amo, mesmo.